Saudades do Taboão da Serra da minha infância
Fim de ano eu entrei no caminhão de mudanças junto com os móveis e meus pais. Fomos para Taboão da Serra. Lembro dos olhos preocupados de minha mãe, do corredor apertado do apartamento e do meu pai me dizendo que eu iria ter um quarto só meu.
Sonho realizado. Não era nos sobradinhos todos iguais, que para mim eram verdadeiras casas de bonecas, onde minha tia morava. O novo lar era no Serra Verde. Lá passei a minha infância e vi Taboão ficar grande. Havia muito mato, muita casa, nenhum supermercado, apenas as vendinhas que tinham tudo o que eu precisava.
A estrada era meu rumo, para quase tudo de importante a gente ia a São Paulo: médico, dentista, trabalho, passeio. Quando saía de perto do meu quintal, o largo do Taboão me tranqüilizava: estava chegando em casa.
Na sétima série, a professora de geografia falou que eu morava na periferia e que pertencia à classe C. Sofri muito, até aquele dia minha cidade era o centro do mundo e não existia classe social.
Eu cresci. Taboão também. Surgiram os semáforos no centro, construíram o Fórum, abriram alguns restaurantes; outros fecharam. A loja de fast-food ficou. A cidade perdeu verde, a estrada se parece mais com uma avenida, tudo pode ser feito aqui, até trabalhar. Hoje, classe social é um conceito que não precisa ser ensinado, até uma criança consegue enxergar.
A árvore que guiou meus desejos já não existe, mas deixou frutos. Minha alma adulta e crítica recorda, e ao fechar os olhos vejo tudo naquele tom alaranjado, como um filme dos anos trinta, e sinto o gosto da infância.